segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Patinho excêntrico*

* Por Julianne Cerasoli

Na segunda bateria de testes de pré-temporada da Fórmula 1, já começamos a nos acostumar com as diversas soluções para a seção final dos bicos. Mas há um carro que teima em não passar despercebido, tamanha sua discrepância em relação a seus pares: o E22 e seu bico duplo.

O regulamento obriga os carros a terem um bico baixo, especifica que apenas é permitido um bico e determina sua posição – em relação a altura e distância, sem mencionar que a seção final do bico deve estar centralizada. Foi aí que entrou a solução engenhosa da Lotus.

Apenas uma das pontas corresponde exatamente ao que as regras dizem em termos de dimensões e posicionamento – a mais longa, da direita. E a da esquerda é no mínimo 51mm mais curta para respeitar a regra. Ou seja, é justamente por uma questão de legalidade que as duas pontas são diferentes, pois a ponta da esquerda seria considerada não um segundo bico, mas uma parte estrutural de seu “irmão”.

Aerodinamicamente, trata-se de um conceito já empregado pela Audi em seu protótipo no Mundial de Endurance há alguns anos. O motivo? Limpar o fluxo de ar. Isso também não é óbvio logo de cara, pois, entre os extremos de ambas as pontas, há uma distância bem maior do que dos bicos “únicos” dos concorrentes - acredita-se que 4cm mais. Porém, é a abertura entre as pontas que harmoniza o fluxo de ar ao diminuir sua obstrução. Como trata-se do primeiro contato do ar com o carro, esse fluxo ganha importância.

Tanto, que ao menos a Toro Rosso admitiu ter estudado solução semelhante. “Estudamos isso no início, quando o carro estava menos maduro, e em teoria funcionaria bem. Mas na realidade sentimos que havia muitas desvantagens. Eles têm um túnel de vento mais desenvolvido do que nós, então talvez tenham descoberto algo que não conseguimos.”

É claro que a Lotus foi nessa direção porque viu que há mais vantagens do que riscos, dentro de sua filosofia de concepção aerodinâmica – algo que faz com que nem todos os times consigam trabalhar bem com determinadas soluções que funcionam para seus rivais. Porém, ao que tudo indica, o estranhamento visual do novo bico deve ser mais significativo do que sua efetividade na pista – segundo o diretor técnico da Ferrari, James Allison, não se ganha mais do que um ou dois décimos nesse setor: “É na traseira que está a pressão aerodinâmica”, explica.

Não é a primeira vez nos últimos anos que o time de Enstone ousa em um conceito técnico. Em 2011, o time apostou em um escapamento frontal, cuja saída era localizada ao lado da entrada dos radiadores e visava aumentar o poderio aerodinâmico de seus gases. Naquele caso, a dificuldade em lidar com o sistema acabou sendo maior do que o ganho teórico. No caso do bico duplo, trata-se de um risco menor e, pelo que temos visto nesse trôpego início – o E22, equipado com a até aqui problemática unidade de potência da Renault, não participou dos primeiros testes e vem andando pouco desde que foi à pista pela primeira vez, em um dos chamados “testes promocionais” –, deve ser o menor dos problemas do time.

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